À boleia pela Vida... Viajar por Dentro e por Fora!

Dois meses mudaram toda a minha Vida. Sem esses dois meses e sem as pessoas com quem me cruzei não seria quem sou hoje. Hoje sou viajante! Mais que nunca! Planos para o futuro: Viver os meus sonhos! Fazer o que me preenche. Mostrar ao mundo que é possível viver os sonhos. Sempre!

Tuesday, October 17, 2006

Para que direcção vai...?

Com frequência me perguntam por que viajo à boleia. Pergunta de facto necessária que só depois de o começar a fazer realmente considerei...

Por que comecei? Porque me dá liberdade. Porque é barato (grátis na maioria das vezes). Porque é uma aventura.

E agora? Será que viajo assim pelos mesmos motivos?

Olho para dentro. Olho para o alcatrão. Olho para as estações de serviço por onde passo, seja no lugar do pendura ou no do condutor. Sorrio e olho para elas como família. Olho para a pessoa que está ao meu lado e decidiu, em poucos segundos, ajudar outra pessoa... Ajudar um viajante.
Olho para tudo isto, pondo-me de fora de mim mesmo e espreitando de fora do carro vejo-me a sorrir. Vejo-me cheio de Vida e Alegria.

Mas porquê? Por que é que o faço se é, segundo consta, tão perigoso?
Por que corro eu então esse risco?

Sim, faço-o. Risco ou não... Algumas variáveis mais controláveis que outras, de facto.

Por vários motivos.

Não necessariamente por esta ordem:

- Porque é de facto barato, permitindo-me liberdade imensa. Liberdade esta pela qual o aeroporto de Lisboa cobra bem alto.. Podemos considerar um autocarro até ao Porto ou Faro e daí seguir acima das nuvens.. Ainda assim... A quantos destinos estamos limitados? A que outros mais quereremos ir tem ter que pagar quantias fora do orçamento de qualquer estudante (digno desse nome)?
Sim, é barato. Sim, deixa-me ir a qualquer lado. Virtualmente qualquer sítio no mundo é-me agora acessível. Tudo passa por uma questão de tempo. Mais ou menos tempo mas é isso mesmo.. Tempo. E tempo não me falta. Condimentado com felicidade, um sorriso, paciência e muita gana de conhecer o Mundo.

- Porque é incerto. Porque demora tempo. Porque tem períodos de espera. Porque tem que ser conquistado e de cada vez que me sento em mais um lugar do pendura (ou no banco de trás se viajar com um casal) me sinto um pouco mais perto do meu destino.
Que prazer nos dá voar? De cada vez que vejo as nuvens fico de facto embriagado. A tecnologia humana permitiu-nos chegar até aqui.. Aliás, voar até tão alto e tão longe. Sim é de facto maravilhoso. Mas e a conquista? E o esforço? E o prazer da vitória? O único esforço envolvido é o de clicar quando se compra o bilhete na net, acordar a tempo de estar 2h antes no aeroporto, e certificarmo-nos que o plafond do cartão de crédito nos permite comprar a passagem para a estratosfera.
E na estrada? Tudo é diferente. Temos que batalhar por cada 50 km que fazemos. Temos que sorrir para que nos aceitem. Temos que realmente estar rodeados de uma aura boa para que consigamos realizar os nossos sonhos.
2h de espera em Valence. Fome de entrar na Suiça. Fome de estrada. Quase desespero por ver o ponteiro das horas avançar implacavelmente em direcção à noite. Difícil e incerta noite, onde o medo tem dose redobrada e a estrada se protege ainda mais do elemento estranho.
Será que consigo chegar hoje a Zurique? Não sei mas vou fazer tudo por tudo para conseguir. É esse o meu objectivo. É essa a minha meta. É esse o meu sonho para as próximas horas. É por esse sonho que vou lutar com todas as minhas energias. Por isso o melhor é pousar a mochila, levantar-me, escrever Zürich no caderno A4 e vestir um sorriso de quem sonha. Em direcção a Zurique!

Para quê sorrir num avião quando um terço da tripulação está histérica com a novidade das asas voadoras, o outro terço está acomodado a dormir (fisica ou mentalmente) e os restantes contam os minutos para chegar ao destino. Todos eles sabem de onde vêm e para onde vão. Eu sei de onde todos vêm e para onde vão.

No avião não há lágrimas, tormento, desespero nem histeria. Alegria? Quando? Talvez quando se descola e quando se aterra. E a viagem? E a viagem mesmo?
Não! No alcatrão cada km é contado como único. Cada paisagem vale por si e não é um simples floco de nuvens, igual a tantos outros.
Não, na estrada a Terra está mais próxima. A Terra que eu quero conhecer.

- No avião não falamos. Não conhecemos. No máximo pedimos um sumo de laranja à hospedeira da TAP que é obrigada a vestir um avental enquanto o hospedeiro tem uma farda normal, não "adornada" isto é.
Na estrada? Sorrio quando penso nisso. Na estrada conhecemos pessoas. Conhecemos vidas. Conhecemos países. Conhecemos línguas, histórias, estórias, políticas, sonhos, projectos, famílias, passados e futuros. Na estrada é nos dada a conhecer a cultura talvez de uma só pessoa. Uma pessoa inserida numa povoação, inserida por sua vez num país, num continente e num Mundo. Um Mundo só. E esta pessoa é uma pequena janela para esse Mundo. Esse Mundo que eu procuro. Esse Mundo que a janela do avião não me deixa ver, obstruída pelos belos, eternos e indiferentes flocos de nuvem.

Sim, viajando conheço pessoas. Mais ligação a umas que a outras. Mais empatia e partilha de formas de pensar com umas do que com outras. Não obstante, um olhar para todas. De perto e de longe. Enquanto eu e enquanto viajante. Enquanto Português e enquanto cidadão do Mundo.

Cada vez que entro na auto-estrada certa sinto um pequeno sentimento de conquista em mim. Uma vitória. Pequena mas gratificante. Um sorriso que sai antes de adormecer no banco de trás de um casal que não conheço mas no qual confio sem sequer me questionar. No avião conto os minutos para adormecer. Até que deixo de conseguir contar e passado um pouco acordo.. a 2000km do sítio onde estava quando adormeci. Insatisfeito, incompleto, chegado ao destino mas sem qualquer desafio.

- Neste mundo de medo. Neste monte de gente que vive a sua vida, que faz o seu percurso, que se lança à estrada na 6ta à tarde para rever a família, reina um mundo de medo. Talvez não constante mas constantemente inconsciente. Medo do próximo. Medo de quem nos olha no metro. Medo de quem demora o seu olhar em nós no centro comercial.
Eu mostro às pessoas que decidem vencer o seu medo e abrir a porta do carro, que esse medo não é tão fundamentado quanto isso. Que esse medo é inflacionado pela sociedade, pelos media, pelas conversas de café.
Sou transportado, falo e partilho ideias. Aprendo e vejo aprender. Oiço e vejo gente reviver em mim os seus sonhos de há pouco. Alguns não realizados. Saio do carro ouvindo "Boa sorte com os teus sonhos." Sei aí que essa pessoa vai para casa pensar nos seus. Vai para casa pensar no acto de hoje. Vai para casa considerar talvez a sua humanidade e a de tantos outros. Vai para casa talvez ler o meu anterior blog e considerar uma postura mais inter-cultural e viajante. Vai para casa talvez considerando deixá-la para trás, para perseguir os seus sonhos, ao me ver a mim, lutar e fazer pelos meus.
Vai para casa sabendo que é possível e que a gente do Mundo é boa. Seja só em parte, em pequeno número ou mesmo escasso. Mas um pouco mais do que ela pensava quando ligou o carro para se atirar indiferentemente ao alcatrão.
Aí eu sinto que toquei dentro de uma pessoa. Aí eu sinto que consegui. Não desejo impacientemente pela próxima. Não. Simplesmente me sento dentro de mim, sorrio e digo para dentro "Missão cumprida."

É por estes motivos todos que eu prefiro as quatro rodas ao trem de aterragem. Que eu prefiro o alcatrão, as montanhas e o verde às nuvens. Que eu prefiro as pessoas à televisão que mostra filmes americanos que eu não veria se coubesse a mim a decisão.

É por isso que eu prefiro viajar pelo Mundo e vê-lo com os meus olhos, sem ser a correr. Com o meu Tempo. Com o Tempo dos outros. Não importa. Tempo não falta. E os sonhos estão na direcção em que a auto-estrada aponta. Só tenho que esperar pela próxima boleia...

Why hitchhiking...?

"Hitchhiking is not for everyone. There are no parties to be had on trains with the backpacker set. No traveling buddy will be there to share laughs, to cover your back. You travel quicker alone. Dropped on a remote highway exit, you may be stuck for hours, singing to yourself for entertainment, throwing stones at trees, watching the cars go by one after another, drivers avoiding making eye contact, while you try to avoid the splash of water from their tires.

But the rewards are great. The freedom of the road, the thrill of uncertainty, not knowing where your next ride, or next shelter or even your destination may be. You have a special opportunity to interact with the locals—people you won’t see in the tourist district, wouldn’t meet in a bar, people you can’t approach on the street. You learn that the reasons for making a road trip are as varied as the people who take them. The conversations will linger longer in my memory than the countryside in which I heard them."

Bill Fink

in http://www.digihitch.com/article637.html

Monday, October 16, 2006

Mestrado na arte de Viver...

"viajar depois da licenciatura é um rito de iniciação tipicamente anglo-saxónico. A escola da vida depois da escola. Durante um par de anos, estes recém-licenciados percorrem o mundo, juntando dinheiro nos países ricos e gastando-o nos países pobres. Ensinam inglês em Itália, fazem as vindimas em França, passam o Inverno a servir à mesa na estância de ski do Colorado e o Verão a lavar conveses nos cruzeiros da Grécia. Por cada mês de salário no Primeiro Mundo viajam quatro meses no Terceiro. Constroem um planisfério pessoal a partir do que a nossa mentalidadezinha acomodada, flácida, horrorizada, chama de "expedientes": a volta ao mundo em 80 expedientes. Regressam a casa com o mestrado na arte de viver."

Gonçalo Cadilhe

in "Planisfério Pessoal"